Justiça aceita denúncia contra acusados de submeterem trabalhadores em situação degradante em carvoaria de Pirajuí
Fotos: Éder Azevedo |
Carvoaria flagrada pela fiscalização funcionava em área rural do município de Pirajuí |
Pirajuí - A Justiça Federal recebeu denúncia do Ministério Público Federal de Bauru contra três pessoas que mantinham onze trabalhadores em condição semelhante à de escravos em carvoaria numa fazenda no município de Pirajuí (58 quilômetros de Bauru). Foram denunciados o comerciante Tadeu Stanislau Bannwart, o policial militar aposentado Daniel Antonio Cinto e sua irmã, a aposentada Maria Helena Cinto, que administravam a carvoaria.
Na Fazenda Reunidas/Santo Antônio de Dourado, em Congonhas, área rural de Pirajuí, os três são acusados de submeteram os onze trabalhadores a trabalhos forçados e jornadas exaustivas, sujeitando-os a condições degradantes de trabalho e restringindo sua locomoção em razão de dívidas. Também não havia registros formais sobre os contratos de trabalho – o que impedia a garantia de quaisquer direitos trabalhistas. A condição análoga à de escravidão foi mantida de janeiro de 2007 a junho de 2008, e entre os trabalhadores havia um idoso então com 70 anos.
Acidentes de trabalho e alimentações são descontados de trabalhadores |
O local de trabalho abrangia uma área destinada à retirada de lenha para a produção de carvão em 17 fornos. Os trabalhadores ficavam num abrigo muito rústico com paredes de madeira serrada, com piso de chão batido, sem banheiro, sem refeitório ou água potável. No local de trabalho também não havia equipamentos de proteção individual, material para prestação de primeiros socorros nem disponibilidade de remoção em caso de acidente de trabalho.
Um desses trabalhadores cortou o dedo com uma motosserra que não tinha trava mecânica e, como não usava luvas, teve um corte profundo na mão. Foi socorrido por um colega de trabalho, mas os patrões não prestaram nenhuma assistência no sentido de encaminhá-lo para atendimento médico e ainda descontaram os dias em que ele não pôde trabalhar em razão do ferimento.
O alojamento tinha mau cheiro e insetos; os dormitórios eram insuficientes para o número de trabalhadores, além de serem desprovidos de armários, camas, lençóis, travesseiros e cobertores. Não havia também local adequado para as refeições – que eram descontadas dos salários. Por ocasião da fiscalização conjunta do Ministério do Trabalho e Emprego e do Ministério Público do Trabalho, foram encontrados no banheiro do alojamento fezes de gato e um rato morto.
Os trabalhos, muito penosos, exigiriam o fornecimento de equipamentos de proteção individual, de transporte adequado e de treinamento específico para os trabalhadores – o que não ocorria em nenhuma etapa da produção de carvão”, diz a denúncia, assinada pelo procurador da República Fábio Bianconcini de Freitas. Entre essas etapas estavam o corte das árvores com motosserras; o carregamento, transporte e descarga das toras em carretas tracionadas por trator; o trabalho com os fornos; a embalagem manual do carvão em sacos; e o posterior carregamento da produção em caminhões. A jornada era exaustiva, sem repouso semanal remunerado, e a remuneração não era registrada em documentos próprios nem paga de modo integral e constante.
A denúncia, apresentada no último dia 21 de janeiro, foi recebida pela Justiça (1ª Vara Federal de Bauru) em 25 de janeiro, por estarem presentes os indícios de autoria e materialidade dos crimes. Os denunciados, portanto, respondem agora na condição de réus, pela prática dos delitos previstos nos artigos 149 (redução a condição análoga à de escravo), 207 (aliciamento de trabalhadores) e 297, parágrafo 4º (falsificação de documento público), todos do Código Penal.
Defesa
O policial militar da reserva Daniel Cinto declarou ontem à noite por telefone ao JC que está tranquilo e confiante quanto a provar que não cometeu nenhum ato ilícito. “Acredito na Justiça e com o desenrolar do processo vamos provar que as denúncias não correspondem aos fatos”, disse. Ele lembra que na época a denúncia inicial a Polícia Militar, corporação à qual servia, investigou os fatos, através de uma comissão de investigação, num trabalho que, segundo ele, consumiu quase duas mil páginas.
“Foram ouvidas todas as pessoas citadas, testemunhas, averiguados os fatos, com vistorias in loco, dentro do rigor que marca as investigações internas feitas pela PM e nada de irregular foi constatado. Posteriormente, a investigação e suas conclusões foram referendadas pela Secretaria de Segurança Pública e pelo Tribunal de Justiça Militar”, afirmou. Daniel fala também por sua irmã Maria Helena Cinto.
Até o fechamento desta edição, o JC não conseguiu localizar o comerciante Tadeu Stanislau Bannwart.
Fonte: jcnet.com.br
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